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Entrevista

Missão EPDRA : formar bons profissionais e bons cidadãos

16/10/2021 às 10:37
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Marly Serras é a nova diretora da Escola Profissional de Desenvolvimento de Abrantes. Assumiu recentemente os destinos desta escola profissional que quer dar a conhecer ao país e que aposta em dar formação aos jovens e incutir-lhes mais cidadania. Há desafios pela frente, como aumentar o internato feminino ou na Herdade substituir os pomares, mas acima de tudo há um fio condutor que tem coisas bem feitas e assim vai continuar. A EPDRA vai abrir o lagar de linha à população e terá uma novidade nos vinhos, um rosé em estreia absoluta.

 

Entrevista por Jerónimo Belo Jorge

 

O que a levou a avançar para a liderança da EPDRA?

O que me levou a avançar para a liderança foi o facto de ao fim de 28 anos de escola, completei a semana passada 28 anos, ter constatado que já tinha feito tudo o que havia a fazer a nível profissional na escola. E pensei que se calhar era a altura de encetar um novo desafio. E esse desafio foi pensado, muito bem discutido familiarmente porque não é um cargo fácil, tem muita exigência. Mas foi tudo muito ponderado e depois a decisão foi nesse sentido, de fazer algo mais por esta escola que eu considero, e todos consideramos, como nossa.

Ou seja, há muito mais tempo de trabalho do que uma carga horária fixa…

Neste cargo se os dias tivessem todos 48 horas era muito bom. É um cargo que implica uma dedicação exclusiva e total e depois tem também muito trabalho. É diferente de ser professor, de vir dar aulas de forma normal. Aqui temos de estar 24 horas alerta porque é uma escola diferente. Nós temos internatos e com esta valência temos sempre de estar atentos. Há um aluno com febre [ainda ontem á noite (n.r. véspera do dia em que fizemos a entrevista) tivemos um aluno com febre e dor de garganta], há um aluno que precisa de ir ao hospital (…) aqui é complemente diferente de uma escola do ensino regular. Se ser diretor de uma escola já implica uma dedicação total, ser diretor de uma escola profissional implica uma dedicação a duplicar.

Foi uma decisão tomada numa fase de desconfinamento. Este último ano e meio mudou muito a escola, assentando num teor muito prático?

Tivemos um ano e meio muito complicado porque a EPDRA é uma escola essencialmente dedicada à parte prática, a preparar os alunos para a parte do trabalho e é muito complicado fazer essa preparação estando online. Houve aqui muita coisa que teve de ser repensada, reestruturada, mas que resultou bem. Agora estamos à espera que este sentimento de saudade da escola que se nota nos alunos, porque se nota uma grande alegria de estarem uns com os outros, os leve a poderem ganhar mais interesse pela escola, pelo estudo.

 

“vamos continuar o vinho e com uma novidade, este ano vamos ter um rosé”

 

Quais são os seus principais objetivos?

Os objetivos passam por continuar a promover um ensino de excelência na nossa escola potenciando aos alunos as competências das profissões que irão exercer futuramente. Mas ao mesmo tempo criar condições para que eles sejam cidadãos plenos, no reforço da cidadania. Que não sejam cidadãos sem a consciência do que é ser um cidadão ativo e participativo na vida da sua comunidade, do seu país. Essa também e também uma das funções da escola…

ou seja incutir nos jovens a cidadania sem ser numa disciplina dedicada?

Sim, sem ser numa disciplina (que já existe). Mas podemos incutir a cidadania em todas as disciplinas porque acho que falta muito isso aos jovens.

E os grandes desafios?

Tenho muitos desafios e muita vontade de toda a comunidade escolar. Existe uma vontade muito grande de levar do nome da EPDRA para fora do concelho de Abrantes. Precisamos de mostrar ao país, e principalmente à região, que estamos aqui. Penso que muitas vezes as pessoas esquecem-se que estamos aqui nas Mouriscas. Estamos são sossegadinhos que às vezes esquecem-se que há aqui uma escola. Precisamos de levar o nome para fora, mas de realçar que temos aqui alunos de norte a sul do país e das ilhas. É claro que há muita coisa a fazer. Partimos com definição que aquilo que foi bem feitos nos anos anteriores é para continuar a fazer. Agora há muitas coisinhas que temos mesmo de mudar.

A EPDRA precisa de captar alunos?

Sim, a escola precisa de captar alunos e precisamos de ser mais inovadores e mostrar que somos uma escola diferente.

O ensino profissional era, há uns anos, considerado como o ensino de recurso para alunos que não queriam ou não tinham interesse no ensino regular. Essa ideia tem vindo a modificar-se?

É um conceito que está a mudar. Há uns anos havia essa ideia que o ensino profissional era o parente pobre da educação. Havia a ideia que os alunos que vinham para o ensino profissional eram aqueles que não conseguiam ir mais longe. Mas na nossa escola nunca se notou isso. Ao longo dos 31 anos temos imensos alunos licenciados e formados com cursos superiores. Aqui nunca notámos muito essa diferença. Mas nos últimos anos os pais começaram a perceber que estas escolas não impedem os alunos de seguir para o ensino superior. E até tem uma vantagem, tem dupla certificação.

Ou seja, têm o 12.º ano e ganham competências?

Sim, fazem o 12.º ano, mas ganham também competências profissionais que lhes permite a entrada direta no mercado de trabalho.

A escola está dividida na Herdade e no Centro Escolar e internato. Ao nível de instalações têm o que precisam ou é altura de começar a pensar em “remodelar ou requalificar”?

Sim. A nível do centro escola já houve uma intervenção muito grande no internato masculino. Os rapazes têm condições adequadas às necessidades. Agora gostávamos de aumentar o internato feminino. Temos 19 alunas e como os t0 não têm capacidade para as acolher todas já transferimos algumas para a pousada. Mas a pousada tem como finalidade acolher pessoas que venham pontualmente e que queiram ficar. Esse é um dos objetivos. Depois há outras coisas na Herdade da Murteira que precisam de intervenção…

ao nível de estruturas ou das próprias culturas…

temos um pomar que precisa de ser renovado porque já é muito antigo.

 

podemos incutir a cidadania em todas as disciplinas porque acho que falta muito isso aos jovens”

 

Como está a ser o arranque deste ano letivo? Têm a formação base, agricultura gestão equina. Depois o turismo….

temos a gestão equina que é o ex-libris da escola. Esgota sempre, temos este ano uma turma de 27 alunos. Eu digo que os cursos são todos iguais, mas este é sem dúvida o que tem uma maior saída. Depois temos o de técnico de gestão agropecuária, o de técnico de cozinha e pastelaria e a novidade, o de bombeiro.

E o de bombeiro, intimamente ligado ao mundo rural, teve muita procura?

Não tanto como nós pensávamos. A expectativa era maior. Vivemos numa região fustigada pelos fogos florestais pelo que temos de apostar nestes cursos para os fogos, mas também muito na área da prevenção.

O segundo ano pode, por via da experiência, “promover” este curso?

Sim, penso que sim. E vai depender muito dos técnicos que temos e daquilo que os alunos do primeiro ano vão mostrar. Mas penso que esta é uma prova daquilo que são os nossos objetivos de mandato que é levar mais a escola para fora, mostrar mais a escola.

E a produção? O vinho já ganha prémios. Há azeite para venda. Leite. Legumes. A produção da Herdade da Murteira vai continuar?

Vamos continuar o vinho e com uma novidade. Este ano vamos ter um rosé. Vamos continuar com o lagar. O ano passado a safra foi fraca não funcionou, mas este ano há muita azeitona como tal já está tudo a ser preparado para arrancar com a campanha. Qualquer pessoa pode vir moer a azeitona à EPDRA no lagar de linha…

e o lagar tradicional não vai funcionar?

Deverá funcionar um dia ou dois, mas para formação dos alunos. O lagar que vai moer é o de linha e quem quiser já se pode inscrever para não termos filas aqui à porta da escola.

 

era bom as pessoas das Mouriscas virem conhecer melhor a escola”

 

Há mais alguma novidade naquilo que é a produção da escola?

Por enquanto não posso adiantar, mas temos algumas ideias que ainda estão no segredo dos deuses, mas que vamos dar a conhecer a seu tempo.

Que ligação espera ter com a comunidade? As gentes de Mouriscas deveriam conhecer melhor a escola, falo da herdade?

Acho que era bom as pessoas das Mouriscas virem conhecer melhor a escola porque acho que a escola dá muito às Mouriscas. Dá muito à atividade económica e, por exemplo, os alunos de segundo e terceiro ano têm quartos e casas alugadas na freguesia. A população precisa de estar mais envolvida com a escola. Não vir só buscar o leite ou os legumes, deveriam vir visitar a escola. Até mesmo o lar de idosos. Antes da pandemia tínhamos um projeto que passava por trazer os seniores à escola e fazer aqui um lanchinho. A pandemia não deixou, mas vamos ver se poderemos pensar em avançar com esta ideia.

EPDRA: BI de uma Escola assente no mundo rural

Marly Serras leva cerca de um mês como diretora da EPDRA. Numa direção no feminino conta com Paula Mano, como subdiretora, e Susana Carvalho, como adjunta, na gestão dos próximos quatro anos.

Criada em 1989, começou a lecionar em 1989/1990 com uma turma de Gestão Agrícola com 20 alunos: os pioneiros. Foi a primeira escola profissional de agricultura de natureza pública. EM 22 de maio de 2000 passou a designar-se por Escola Profissional de Desenvolvimento Rural de Abrantes.

Atualmente a EDPRA conta com cerca de 140 alunos oriundos de todas as regiões do país e dos arquipélagos e ainda com 8 jovens dos PALOP, nomeadamente de Angola, Moçambique, São Tomé e Cabo Verde.

Nesta altura conta com um quadro de cerca de 30 professores e outros tantos funcionários que garantem o funcionamento da escola e da Herdade da Murteira.

Todos os dias os funcionários tomam conta 68 hectares. E têm ainda 142 ovinos e caprinos. Têm os cavalos, a vacaria e uma área de suinicultura. Só não têm aves.

A herdade tem ainda o pomar (dois hectares), ou a área das árvores de fruto. Há Laranjeiras, diospireiros, pessegueiros, macieiras, pereiras, nespereiras, romãzeiras, ameixoeiras, cerejeiras, nogueiras, figueiras, marmeleiros e meio hectare de amendoeiras.

Tem o olival (três hectares), de onde sai a azeitona para ser moída no lagar (um de linha e outro tradicional), as vinhas (três hectares) para produção dos vinhos (branco e tinto) e ainda uma zona de medronheiros e dez hectares de pinheiro manso e mais três hectares de pinhal com cerca de três anos. Depois acrescenta-se toda uma área mais florestal.