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Sapicos de cultura

“O Touro - sua nobreza e simbolismo”, por Luís Barbosa

10/05/2021 às 07:45
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Luis Barbosa

SALPICOS DE CULTURA….

“O Touro - sua nobreza e simbolismo”

Não tem sido usual aproveitarmos o espaço destes textos para relevar iniciativas da A.I.E.S.M.P. – Associação Internacional de Estudos Sobre a Mente e o Pensamento. Temos tido contenção nesses propósitos. Porém, também pensamos que por vezes não fica mal dar conta de atividades que, nestes dias mais sombrios, possam ajudar a enaltecer aspetos culturais e sociais significativos.

Então, olhando para alguns catálogos de iniciativas que a Associação tem promovido, ou tem apoiado, o meu olhar prendeu-se a uma pequena brochura que dá conta da realização em 2019 de um evento que muito me deixou a pensar.

A Associação foi convidada a ser parte ativa numa atividade que na Chamusca foi realizada por uma empresa da zona e que teve o touro como motivo. Tratou-se de uma mesa redonda de caráter internacional integrada nos objetivos de promover um novo paradigma de reconversão sócio cultural. Para tal os organizadores determinaram como intuito primeiro reavivar memórias e restituir a nobreza esquecida da imagem do touro e da terra ribatejana.

Ao tempo estava-se no auge da célebre discussão sobre as questões das touradas pelo que, quando o convite foi feito à Associação, refletiu-se sobre a necessidade de acautelar possíveis tensões que discussões acaloradas pudessem despoletar. Contudo, cedo se percebeu que os propósitos dos organizadores ultrapassavam em muito a temática taurina, e que, embora esta pudesse fazer parte das conferências a realizar não era, de todo, a determinante da atividade.

Foram três dias de excelentes conferências. Participaram conferencistas nacionais e estrangeiros e das temáticas tratadas duas se tornaram relevantes: discutiu-se a dignidade e nobreza do touro, enquanto animal mitológico e pertença da modernidade, e refletiu-se sobre a importância que revisitar tais atributos pode e deve ter para restaurar otambém nobre e digno contexto ribatejano.

Foram várias os intervenientes que falaram sobre as questões anteriores, mas um deles, pelo que referiu, ficou-me mais na memória. Foi o Prof. Dr. Dario Seglie, responsável pelo CeMAP – Centro de Estudos e Museu de Arte Pré-Histórica, da IFRAO – UNESCO, oficial de ligação desta instituição com o Politécnico de Torino, em Itália, que desenvolveu o tema “Signos e Símbolos do Paleolítico até aos Limiares da História” e sobre o touro disse:

“O homem pré-histórico sempre se viu cara a cara com o touro, majestoso, grande e poderoso quadrúpede, orgulhoso e corajoso. Essas caraterísticas, combinadas com a beleza das formas imponentes e ágeis, com a massa muscular bem distribuída que proporciona ao touro uma aparência esteticamente relevante, contribuíram para a criação da narrativa simbólica e mítica desse animal]…[A força da imagem do touro no contexto mitológico, terrestre, cosmológico e primordial, manifestou-se de maneira explícita e poderosa também através da sua representação nas figuras gravadas e pintadas nas paredes rochosas das cavernas. Essas manifestações da arte parietal paleolítica, presente no sul da Europa, diz-nos que as figuras mais antigas datam de há mais de 35.000 anos.” (pág. 7, Diálogos 2019)

Bem, no final desta intervenção fiquei a pensar duas coisas. Uma a de que as muitas e diversas discussões a que ao tempo vinha assistido sobra as questões das touradas, embora sugerissem que a temática é no momento da maior importância, deixavam ocultos indicadores culturais da maior relevância para o entendimento de muitos dos contextos nacionais em que vivemos. Outra a de que é necessário introduzir, no plano educativo, muitos temas que nos permitam de facto compreender a extensão e profundidade de muitos símbolos e rituais que marcam a cultura de povos e regiões. Não para ficarmos agarrados às formas antigas com que os mesmos emergiram, mas para os transpor como formas de vida que no presente podem ajudar a moldar novas maneiras regionais de organizar os contextos em que vamos percorrendo o estar por cá.

Despeço-me com amizade,

Luís Barbosa*

*Investigador em psicologia e ciências da educação
SALPICOS DE CULTURA, uma parceria com a Associação Internacional de Estudos Sobre a Mente e o Pensamento (AIEMP)