Abrantes Confraria do Bucho e Tripas do Pego lança livro de receitas pegachas (C/ Áudio)
A Confraria do Bucho e Tripas do Pego, concelho de Abrantes, apresentou no passado sábado, dia 19 de outubro, o livro “O que é o comer?”.
Uma obra que nasceu com o intuito de preservar as tradições pegachas à mesa.
Os saberes e sabores da cozinha da aldeia, principalmente os petiscos, que tornaram o Pego na maior tasquinha do concelho de Abrantes e até da região.
Um trabalho “de mais de quatro anos” como explicou a Grã-Mestre da Confraria, Daniela Canha, que disse ser um momento “de muito orgulho”.
“Vimos na medida ‘Renovação de Aldeias’, no âmbito do PDR-2020, a oportunidade de materializar todo um património tão vasto e rico como é a gastronomia pegacha”, afirmou Daniela Canha que assegurou que no livro não se encontram apenas receitas, pois “são vivências, são histórias e são heranças que tão bem nos caracterizam e que fazem de nós a capital do petisco”.
O confrade André Serrano foi quem teve a ideia de reunir em livro as receitas gastronómicas do Pego e foi ele quem explicou o que se pretende com o livro agora apresentado. Começou por dizer que “este livro é um hino ao Pego, é um hino aos pegachos e é um hino à vontade de fazer bem e de comer bem”, pois, como afirmou, “nós somos os verdadeiros comensais”.
André Serrano lembrou que “estas receitas que existem e que são um património imenso, vai desaparecer. Se não fizermos nada, isto vai desaparecer e esquece-se no tempo”. Lembrou que as receitas que estão no livro “são das gentes do Pego” e que a recolha foi um trabalho de todos os confrades que se empenharam em correr todas as ruas da aldeia.
“O que é o comer?” conta com 89 receitas, “são bastantes e penso que haveria outras 89 ou, se calhar, duas vezes 89”.
O confrade revelou que o objetivo da Confraria do Bucho e Tripas “é este mesmo”, pois “a Confraria nasceu para isto, para preservar o que é o património identitário do Pego e o património gastronómico, essencialmente”. André Serrano apelou depois às entidades competentes para “estarem atentos ao valor que tem o bucho e tripas, ao valor que tem a gastronomia do Pego” e desafiou a que “devemos apoiar isto, de maneira a que não desapareça no tempo”.
A publicação contou com a participação e envolvimento da comunidade pegacha, dos confrades e com as colaborações especiais de Isilda Jana, com receitas e a contextualização histórica e também de Francisco Lopes na coordenação editorial. A paginação e todo o trabalho de design foi da responsabilidade da Napperon de Paulo Passos. Os três tiveram oportunidade de explicar a sua parte da intervenção na obra perante uma plateia atenta que se deliciou ao ouvir “histórias do antigamente”. Francisco Lopes “puxou” ainda por Isaurinda Pratas Morgado e Conceição Vilhais, que durante anos estiveram à frente de duas das tascas mais emblemáticas do Pego.
Sobre o papel da TAGUS, a Associação de Desenvolvimento Integrado do Ribatejo Interior, neste processo, falou a coordenadora técnica Conceição Pereira que deixou desafios à Confraria e a toda a comunidade e disse que “o papel da TAGUS é este mesmo”.
O primeiro desafio prende-se com o alerta de que “estamos a concluir um Quadro Comunitário e um período de financiamento. A partir de janeiro de 2025 vamos começar outro período de financiamento e a TAGUS está novamente no território”. Pediu que surjam ideias para que outros projetos se possam concretizar.
Quanto ao livro “O que é o comer?”, que Conceição Pereira classificou de “excelente”, pediu que “sirva de exemplo ao nosso concelho de Abrantes para encontrar outros bons projetos que conheçamos no nosso território, que nos digam muito, sejam eles da gastronomia, da identidade local, da nossa cultura, do nosso património... e que saibamos fazer uma junção tão importante como foi esta: a junção do passado com o futuro”.
O segundo desafio “é que este livro passe de mão em mão na nossa comunidade, que o entreguemos agora no período de Natal como prenda, que o levemos para longe como bom exemplo do património, da nossa identidade, do Pego”. Conceição Pereira pediu ainda ao presidente da Câmara de Abrantes “que o entregue junto do Ministério da Agricultura, para valorizar o papel dos Grupos de Ação Local e a proximidade que conseguimos fazer”.
A coordenadora técnica da TAGUS concluiu a dizer que “temos um maravilhoso livro (...) que é um livro de comunidades, de sensibilidades e é um livro genuíno”.
Bia Salgueiro é a presidente da Junta de Freguesia do Pego e agradeceu à Confraria “pela excelente ideia”, “por tudo o que têm feito”, “por levarem o nosso Pego a vários sítios” e pelo trabalho em prol da preservação das tradições. Não esqueceu “a nossa fala”, tão característica e identitária dos pegachos mas lembrou que “os pegachos têm muitos desafios”. As casas de petisco estão a desaparecer no Pego e instou a Confraria e todas as Associações da aldeia a fazer algo para mudar este cenário.
Na mesma senda de desafio, o presidente da Câmara de Abrantes também instou a comunidade a unir-se em prol deste desígnio: recuperar as casas de petisco do Pego. Lembrou algumas das casas já desaparecidas e “disse ter esperança”. Manuel Jorge Valamatos realçou o papel da Confraria do Bucho e Tripas e lembrou que os jovens que a compõem são uma boa amostra do que o futuro pode trazer.
Falou do livro como “um documento absolutamente fundamental para preservar as memórias, em vez de se perderam” apenas por transmissão oral. Destacou “a inteligência na gestão deste processo” pelo facto dos confrades terem procurado parcerias “com gente competente nestas áreas”, referindo-se a Isilda Jana e Francisco Lopes, bem como a Paulo Passos, “um dos melhores a nível nacional na área do design”.
Deixou ainda “uma palavra muito especial para o trabalho que a Confraria do Bucho e Tripas tem vindo a fazer ao longo deste tempo” e confessou que desde o início da Confraria do Bucho e Tripas, “sempre tive esta expetativa de que esta entidade iria conseguir criar isto mesmo. Porque para além dos aspetos culturais e da história, tem uma dinâmica muito interessante na valorização do nosso património, deste sentir de ser pegacho”.
Para o encerramento de muitas casas de petiscos no Pego, Manuel Jorge Valamatos disse haver “várias razões” para que tal tenha sucedido mas que “não podemos atirar a toalha ao chão e temos que acreditar que é possível dar aqui uma nova forma de olhar para a economia local, para as dinâmicas locais e para a vida das pessoas”.
O autarca referiu ainda que “todos temos orgulho de uma história imensa, de muitas décadas de petisco no Pego. Tivemos momentos gloriosos, temos agora momentos de alguma fragilidade” e, mais uma vez, desafiou a Confraria do Bucho e Tripas e toda a comunidade pegacha a trabalharem para que “esta terra tenha perspetivas de futuro onde mantemos, respeitamos e nos orgulhamos daquilo que foi o nosso passado”.
A cerimónia não terminou sem que a Confraria lembrasse que a obra “O que é o Comer?” é um documento “que fica bem em cada casa pegacha e não podemos esquecer que é também uma ótima prenda de Natal”.
No final, terminou como terminam todas e quaisquer atividades no Pego: à volta de uma mesa recheada, de prato cheio e de copo na mão.
Fotos: Município de Abrantes e Confraria do Bucho e Tripas